Origem:
RIO DE JANEIRO - RJ
Resumo:
AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL - ABUSO - DE PODER ECONÔMICO -
DE PODER POLÍTICO / AUTORIDADE - USO INDEVIDO DE MEIO DE COMUNICAÇÃO
SOCIAL - PEDIDO DE CONCESSÃO DE LIMINAR - PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO A
ACÓRDÃO
Decisão:
DECISÃO Trata-se de ação cautelar proposta por Andreia Cristina
Marcello Busatto visando suspender os efeitos do acórdão do Tribunal
Regional Eleitoral do Rio de Janeiro que, em sede de ação de
investigação judicial eleitoral, lhe cassou o diploma de deputada
estadual e declarou sua inelegibilidade por oito anos, em razão de
entender configurado o abuso do poder político e econômico, bem como o
uso indevido de meio de comunicação social, em benefício da candidatura
da autora, por ocasião do pleito de 2010. Em 15.7.2011, o eminente
Ministro ARNALDO VERSIANI, no exercício da Presidência do TSE, deferiu a
medida liminar para suspender os efeitos do decisum regional até o
julgamento e publicação do acórdão dos embargos de declaração opostos na
origem (fls. 1.159-1.161 - vol. 4). Sobreveio o julgamento dos
embargos, os quais foram rejeitados pela Corte a quo, dando ensejo, nos
presentes autos, a pedido da autora de extensão dos efeitos da liminar
(fls. 1.173-1.184 - vol. 5), o qual foi deferido pelo eminente Ministro
RICARDO LEWANDOWSKI, em 29.7.2011, nos seguintes termos (fls.
1.402-1.404 - vol. 5): [...] O pedido de extensão da liminar merece ser deferido. Destaco,
inicialmente, que, ao julgar o RE 633.703/MG, Rel. Min. Gilmar Mendes, o
Plenário do Supremo Tribunal Federal decidiu que as alterações
introduzidas pela LC 135/2010 não se aplicam às Eleições Gerais de 2010,
em razão do princípio da anualidade da lei eleitoral (art. 16 da
Constituição). No mesmo sentido, por óbvio, caminhou a jurisprudência
do TSE que, em observância à decisão supracitada, passou a inaplicar a
LC 135/2010 aos processos referentes ao último pleito, restringindo-se
em suas decisões à redação original da LC 64/1990. Precedentes: Questão
de Ordem no RO 1697-95/MT, Rel. Min. Cármen Lúcia, e Questão de Ordem no
RO 693-87/RR, Rel. Min. Marcelo Ribeiro. Pois bem, consta da ementa do acórdão recorrido: "(...) Possibilidade
de aplicação da penalidade de cassação de diploma e da sanção de
inelegibilidade no prazo de oito anos, tendo em vista que uma vez
praticada conduta definida como ilícito eleitoral, impõe-se verificar a
respectiva sanção prevista em lei no momento de sua ocorrência.
Aplicação da LC n° 135/10, tendo em vista o ato abusivo ter sido
praticado na sua vigência" (grifei). Portanto, mesmo em análise
perfunctória, típica das medidas de urgência, transparece dos autos, com
elevado grau de certeza, que o TRE/RJ desconsiderou os precedentes
citados e fez incidir no caso sub examine a LC 135/2010. Isso
porque, antes do advento da chamada "Lei da Ficha Limpa" , na
perspectiva da redação antiga do art. 22, XIV, da Lei Complementar
64/90, o Tribunal Superior Eleitoral, no julgamento do RO 1.362/PR,
concluiu, após longos debates, que a sanção de cassação de registro
somente seria possível na hipótese da ação de investigação judicial
eleitoral, por abuso de poder, se julgada até a data da diplomação. O
acórdão, de Relatoria do Min. Ayres Britto, recebeu a seguinte ementa: "AÇÃO
DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. PRELIMINARES REJEITADAS. ABUSO DE
PODER E USO INDEVIDO DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO. CONFIGURAÇÃO. AÇÃO
JULGADA APÓS AS ELEIÇÕES. CASSAÇÃO DE REGISTRO E INELEGIBILIDADE.
POSSIBILIDADE. RECURSO DESPROVIDO. 1. Não há cerceamento de defesa
quando a prova requerida pela parte, e indeferida pelo relator, é
desnecessária à solução da controvérsia. 2. A nulidade relativa deve
ser arguida na primeira oportunidade que a parte tiver para se
manifestar nos autos, pena de preclusão. 3. Ausência de julgamento extra petita. 4.
A ação de investigação judicial eleitoral constitui instrumento idôneo à
apuração de atos abusivos, ainda que anteriores ao registro de
candidatura. Precedentes. 5. O Tribunal Regional pode analisar a
questão da cassação de registro em sede de embargos de declaração,
quando a própria Corte reconhece omissão do acórdão embargado,
suficiente para a concessão de efeitos infringentes. 6. O conjunto probatório dos autos revela o abuso do poder político, econômico e o uso indevido dos meios de comunicação. 7.
A potencialidade para influenciar o resultado do pleito é manifesta. O
nexo de causalidade quanto à influência das condutas no pleito eleitoral
é tão-somente indiciário, sendo desnecessário demonstrar, de plano, que
os atos praticados foram determinantes do resultado da competição;
basta ressair, dos autos, a probabilidade de que os fatos se revestiram
de desproporcionalidade de meios. 8. O todo articulado da
Constituição Federal abona a conclusão de que, nos termos do inciso XIV
do artigo 22 da Lei Complementar nº 64/90, é possível, em sede de ação
de investigação judicial eleitoral, a imposição da pena de cassação de
registro e de inelegibilidade, mesmo após o dia da votação, mas antes da
diplomação do candidato eleito. Interpretação constitucional que visa a
excluir um vácuo jurisdicional (do dia da votação até a diplomação dos
eleitos) durante o qual não existiria qualquer provimento jurisdicional
efetivo, capaz de gerar a cassação de registro, hábil a afastar do
processo eleitoral e a impedir que venha a ser diplomado o candidato que
abusou do seu poder econômico ou político. 9. Execução do julgado com a publicação deste acórdão. 10. Recurso desprovido" (grifei). No
caso, patente a fumaça do bom direito, especialmente porque a sanção de
cassação de registro somente foi possível ante a modificação redacional
contida no art. 22, XIV, da Lei Complementar 64/90, introduzida pela
Lei Complementar 135/2010, que permitiu a imposição daquela sanção mesmo
após a proclamação dos eleitos. Não há, portanto, falar em cassação
de mandato por abuso de poder em processos regulados pela redação
original da LC 64/1990 nos casos em que a decisão é posterior à
diplomação. Tampouco podemos falar em inelegibilidade de 8 (oito) anos
para a hipótese dos autos, uma vez que o prazo da redação original
cingia-se a 3 (três) anos. Ressalto, por fim, decisão recente de
minha lavra, AC 1304-45/RJ, na qual deferi liminar para suspender a
execução de acórdão regional em hipótese em muito similar à dos autos. Pelo exposto, defiro o pedido de extensão da liminar para conceder efeito suspensivo ao recurso ordinário interposto. [...]. (grifos no original) Dessa decisão não houve recurso, consoante certidão de fl. 1.415 - vol. 5. O
Ministério Público Eleitoral apresentou contestação em que pugna pela
improcedência da ação cautelar, à consideração de que os recursos
eleitorais não possuem efeito suspensivo e, ainda, por faltar
plausibilidade ao pedido, uma vez que, na sua dicção, [...] o
acórdão regional encontra-se fortemente amparado em provas robustas da
prática de abuso do poder econômico, político e uso indevido de meio de
comunicação social por parte da requerente, consubstanciados na coação
de servidores contratados temporariamente para participarem de sua
campanha, no aporte financeiro em veículo da imprensa para que alterasse
sua posição em seu benefício, bem como na utilização de dois jornais
para sua promoção indevida. (fl. 1.421 - vol. 5) Por meio de petição
protocolizada em 27.8.2012 (fls. 1.462-1.474), a autora requer a
explicitação acerca da abrangência da liminar concedida em julho de 2011
pelo Ministro RICARDO LEWANDOWSKI, ao argumento de que vem sofrendo
"prejuízos graves e atuais" no processo de registro de candidatura, por
meio do qual pretende disputar as eleições de 2012 para a Prefeitura do
Município de Mangaratiba/RJ. Afirma que seu pedido de registro foi
indeferido pelo Juízo da 54ª Zona Eleitoral do Rio de Janeiro ao
entendimento de que a liminar nos autos da presente ação cautelar
concedeu efeito suspensivo ao recurso ordinário somente para o fim de
ela permanecer no cargo de deputada estadual, nada referindo sobre a
declaração de inelegibilidade. Cita precedentes desta Corte que
corroborariam a tese de que a decisão liminar abrangeria também a
suspensão dos efeitos quanto à declaração de inelegibilidade,
sustentando que decorreria, também, do reconhecimento da
inaplicabilidade da LC nº 135/2010 ao caso em questão. Requer a
explicitação quanto à abrangência da liminar e, se não for esse o
entendimento, a concessão da medida liminar para suspender a
inelegibilidade declarada nos autos da AIJE nº 18-04. Isso porque
entende demonstrada a plausibilidade e o risco de dano irreparável
iminente em razão de o acórdão do TRE/RJ merecer reforma, ante a
impossibilidade de aplicar a condenação estabelecida no artigo 22, XIV,
da LC nº 64/90, com a nova redação dada pela LC nº 135/2010, bem como
por não estar configurada a prática de abuso do poder ou uso indevido de
meio de comunicação. A Coligação Mangaratiba Crescendo com o Povo e
seu candidato a Prefeito de Mangaratiba no pleito de 2012, Evandro
Bertino Jorge, requerem seu ingresso no feito como assistentes,
considerando a repercussão nas suas esferas de interesse em face das
eleições vindouras (fls. 1.501-1.510 - vol. 5). Sustentam a
impertinência do que requerido, haja vista o grande lapso de tempo
transcorrido desde a prolação do decisum liminar, bem como por não estar
albergado o requerimento na hipótese do artigo 26-C da LC nº 64/90,
acrescido pela LC nº 135/2010. Decido. Não obstante a
jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral admitir, em circunstâncias
excepcionais, a concessão de efeito suspensivo a recurso não dotado
desse efeito em razão da regra estabelecida no artigo 257 do Código
Eleitoral, essa outorga por intermédio de cautelar incidental depende da
satisfação cumulativa dos requisitos da fumaça do bom direito e do
perigo na demora. No caso, a concessão da medida liminar fundou-se,
exclusivamente, na impossibilidade de aplicar à hipótese dos autos o
disposto no inciso XIV do artigo 22 da LC nº 64/90, com a redação dada
pela LC nº 135/2010, verbis: Art. 22 [...] XIV - julgada
procedente a representação, ainda que após a proclamação dos eleitos, o
Tribunal declarará a inelegibilidade do representado e de quantos hajam
contribuído para a prática do ato, cominando-lhes sanção de
inelegibilidade para as eleições a se realizarem nos 8 (oito) anos
subsequentes à eleição em que se verificou, além da cassação do registro
ou diploma do candidato diretamente beneficiado pela interferência do
poder econômico ou pelo desvio ou abuso do poder de autoridade ou dos
meios de comunicação, determinando a remessa dos autos ao Ministério
Público Eleitoral, para instauração de processo disciplinar, se for o
caso, e de ação penal, ordenando quaisquer outras providências que a
espécie comportar; [...]. Contudo, o entendimento mais atual desta
Corte é no sentido da aplicação do referido dispositivo para hipótese
como a dos autos, conforme se depreende do seguinte julgado, verbis: RECURSO
ORDINÁRIO. PROVIMENTO PARCIAL. DEPUTADO DISTRITAL. COMPRA DE VOTOS.
COAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS. MANUTENÇÃO. ABUSO DE PODER. INELEGIBILIDADE.
CASSAÇÃO DE DIPLOMA. INCIDÊNCIA. LC Nº 135/2010. RECURSOS ESPECIAIS
PREJUDICADOS. ASSISTENTES SIMPLES. DESISTÊNCIA. RECURSO. ASSISTIDO. 1.
A utilização da estrutura de empresa de considerável porte para a
realização de campanha eleitoral em favor de candidato, mediante a
convocação de 1000 (mil) funcionários para reuniões nas quais houve
pedido de votos e disponibilização de material de propaganda, bem como a
distribuição posterior de fichas de cadastros nas quais cada empregado
deveria indicar ao menos dez pessoas, configura abuso do poder
econômico, com potencial lesivo ao pleito eleitoral. 2. Tais condutas
também configuram captação ilícita de sufrágio, na linha de
entendimento da Corte, com ressalva do ponto de vista do relator. 3.
Aplica-se o disposto no art. 22, XIV e XVI, da LC nº 64/90, com a
redação da LC nº 135/2010, que estabelece a pena de cassação por abuso
de poder, independente do momento em que a ação for julgada procedente, e
aumenta o prazo de inelegibilidade de 3 (três) para 8 (oito) anos. 4.
Não incide na espécie o princípio da anterioridade legal insculpido no
art. 16 da Constituição Federal, uma vez que o dispositivo em comento,
modificado pela Lei da Ficha Limpa, não altera o processo eleitoral. 5.
O pedido de desistência do recurso interposto pelo assistido acarreta o
prejuízo dos recursos manejados pelos assistentes, que não podem
recorrer de forma autônoma. 6. Recurso Ordinário desprovido, para
manter a cassação do diploma, a imposição de multa e a declaração de
inelegibilidade por 8 (oito) anos, com base nos arts. 41-A da Lei nº
9.504/97 e 22, XIV e XVI, da LC nº 64/90, com a nova redação da LC nº
135/2010, em razão da prática de abuso do poder econômico e captação
ilícita de sufrágio. 7. Recursos especiais prejudicados. (RO nº 4377-64/DF, Rel. Ministro MARCELO RIBEIRO, julgado em 17.11.2011, DJe 9.12.2011 - nosso o grifo) Quanto
ao mais, o exame perfunctório das razões do recurso ordinário não
vaticina a pretensão do autor de admitir a existência de plausibilidade
jurídica. Isso porquanto não se evidencia, primo ictu oculi, o desacerto
da Corte de origem, consoante se depreende da letra do acórdão
recorrido, que detalhadamente discorre sobre todos os fatos alusivos à
causa, respaldando-se em provas testemunhais e documentais, para
concluir pela prática do abuso do político, econômico e uso indevido de
meio de comunicação social. Destaca-se, por pertinente, a ementa do
julgado combatido, verbis (fl. 1.319 - vol. 5): Ação de Investigação
Judicial Eleitoral. Eleições 2010. Prática de abuso de poder político,
poder econômico e uso indevido dos meios de comunicação. Configuração.
Procedência. Rejeição da preliminar de ilegitimidade passiva dos
investigados não candidatos, posto que a norma insculpida no art. 22,
XIV, da LC nº 64/90 dispõe que todos os que tenham praticado condutas
abusivas com finalidade de promover candidatura, deverão ser punidos.
Para tanto, necessário se faz que haja o litisconsórcio passivo. No mérito, configuradas as condutas abusivas. Quanto
ao abuso do poder político, tem-se a prática comprovada de coação dos
servidores contratados temporariamente ou em comissão, para participarem
da campanha da primeira investigada. Além disso, da análise das
circunstâncias, observa-se que foi conferido aporte financeiro em jornal
para que mudasse de posição e passasse a promover a candidatura da
primeira investigada. Quanto ao uso indevido dos meios de
comunicação, ficou configurado que os dois últimos investigados,
responsáveis pelos periódicos "Jornal Atual" e "Jornal Impacto"
usaram-os para promoção indevida da primeira investigada, gerando
desigualdade no pleito. Afasta-se a alegação defensiva de
potencialidade lesiva, posto que requisito não mais previsto em lei
(art. 22, XVI, da LC 64/90). Ademais, ainda que fosse imprescindível a
sua aplicação, verificou-se, no caso, que houve gravidade bastante nas
condutas para caracterizar o abuso, capaz, inclusive, de influenciar no
pleito. Possibilidade de aplicação da penalidade de cassação de
diploma e da sanção de inelegibilidade no prazo de oito anos, tendo em
vista que uma vez praticada conduta definida como ilícito eleitoral,
impõe-se verificar a respectiva sanção prevista em lei no momento de sua
ocorrência. Aplicação da LC nº 135/10, tendo em vista o ato abusivo ter
sido praticado na sua vigência. Procedência do pedido. (nossos os grifos) Nesse
contexto, para suspender os efeitos do acórdão regional, seria
necessária uma profunda análise das provas, o que não se admite em ação
cautelar (AgR-AgR-AC nº 3.220/MG, Rel. Ministro RICARDO LEWANDOWSKI,
julgado em 30.6.2009, DJe 1º.9.2009). Cabe assinalar, quanto ao
pedido de explicitação da medida liminar, a par de estar prejudicado,
mostra-se incabível, à míngua de fundamento legal. Pelo exposto, nos
termos do artigo 36, § 6º, do Regimento Interno do Tribunal Superior
Eleitoral, nego seguimento à ação cautelar, tornando sem efeito a
liminar deferida nestes autos, prejudicados os pedidos de fls.
1.462-1.474 e 1.501-1.510. Publique-se. Intimem-se Brasília, 30 de agosto de 2012.
MINISTRO GILSON DIPP RELATOR |